Ansiedade Infantil e o papel das escolas

05/11/2025

Reggio Emilia, cidade no Norte da Itália, é o berço de uma abordagem educativa que inspira escolas ao redor do mundo. Loris Malaguzzi, um pedagogo visionário, abraçou a iniciativa de construir uma proposta educacional com o apoio da comunidade após a Segunda Guerra.

Em Reggio Emilia, na primavera, ocorre um evento que dura uma semana e envolve toda a cidade – Reggionarra, um projeto cultural dedicado à arte de narrar, nascido em 2006. O projeto é inspirado na crença de que cada pessoa tem talento natural para contar histórias e transformar cada pequeno acontecimento diário em uma extraordinária experiência de vida.

Reggionarra transforma Reggio Emilia na cidade das histórias: contadores de histórias profissionais e companhias de teatro, juntamente com os pais no papel de contadores de histórias, animam vários lugares que se tornam espaços narrativos dedicados a ouvir histórias, contos de fadas e leituras animadas. A contação de histórias é a protagonista de uma experiência comunitária em que as pessoas, como nas praças do passado, se encontram para trocar histórias e contos, transformando praças, pátios, escolas e bibliotecas, em pequenos ou grandes palcos de vida narrada.

Aqui na Escola Cidade Jardim | PlayPen, há 7 anos, inspirados na experiência de Reggio Emilia temos o PlayPen Narra – um convite às famílias a adentrar as portas da sala de aula e compartilhar histórias, lidas ou narradas, com as turmas de seus filhos. A participação das famílias no projeto educativo é um traço qualificador na experiência educativa.

Contar histórias é um ato de criatividade. É uma forma de criar significados, de se abrir ao novo, de dar formas a mundos possíveis e inéditos.

As histórias ajudam adultos e crianças a redescobrir e regenerar o prazer de ouvir e o prazer de narrar, a devolver significado e encanto às palavras faladas, lidas, escritas e ouvidas.

A magia das histórias cruza a realidade com a fantasia, nos ajuda a encontrar vida e cultura, conhecer e interpretar o que nos rodeia.

‘Narrare è come viaggiare – attraverso le storie, le culture, I popoli.

Chi viaggia incontra persone, identità, oggetti.

Chi viaggia insegue i sogni e le meraviglie dela vitta. Chi viaggia conosce, apprende e as poi raccontare. Viaggiare, quindi, è come narrare.’

‘Narrar histórias é como viajar – através de histórias, culturas e povos. Quem viaja encontra pessoas, identidades, objetos.

Quem viaja persegue os sonhos e as maravilhas da vida. Quem viaja conhece, aprende e depois sabe recontar.

Viajar, portanto, é como narrar histórias.

Che cos’è Reggionarra | Reggionarra

Sem dúvidas vivemos a era da ansiedade. Alimentada pela hiperconectividade, o uso das redes sociais, que aumentam o padrão (estético, financeiro, performático) e a demanda por produtividade e resultados, a ansiedade é fator presente e inseparável do nosso modo de funcionamento atual.

Quando a ansiedade chega às crianças

Inevitável e infelizmente, esse transtorno também atinge nossas crianças, especialmente no período pós pandêmico: estudos apontam que 7% das crianças entre 13 e 17 anos nos EUA já foram diagnosticadas com transtorno de ansiedade e, em contexto de pandemia, uma meta-análise apontou que 26% das crianças e adolescentes entrevistados, relataram sintomas deste transtorno.

Esses não são fatos isolados e os sintomas não podem ser negligenciados ou confundidos com “falta de vontade”, “insegurança” ou “frescura”. Embora sentir medo, preocupação ou receio seja parte normal e fundamental do desenvolvimento infantil, quando comportamentos como esses se tornam impeditivos para a realização de tarefas cotidianas, precisamos estar em alerta. Precisamos observar os padrões de comportamento social, familiar e escolar para entender se a recorrência desses comportamentos se caracteriza como um transtorno perene e crônico.

Os fatores de risco do dia a dia

Um estilo de vida excessivamente demandante, um contexto familiar de altas cobranças e expectativas e vivências precoces de estresses emocionais andam lado a lado com uma vida escolar intensa, do ponto de vista acadêmico e social, como fatores de risco para a ansiedade infantil. A isso, somam-se os perigos da internet e das redes sociais, onde as crianças entram em contato com assuntos para os quais não estão prontas nem física, nem neurológica e muito menos psicologicamente para lidar. Conteúdos altamente sexualizados, conversas ofensivas, padrões estéticos e emocionais inatingíveis, exposição a perigos que eles são incapazes de dimensionar – tudo isso em livre demanda, sem supervisão, atingindo um cérebro imaturo e abrindo brechas para que a angústia e a ansiedade tomem conta.

Somos todos responsáveis pelos cuidados precoces, para que a ansiedade na infância não gere impactos que serão carregados pelo resto da vida: segundo estudo publicado em março de 2023 na “The British Journal of Psychiatry” pela Cambridge University Press, padrões de ansiedade e depressão persistentes da infância à adolescência estão associados a piores desfechos em saúde mental, educação e emprego na vida adulta.

Como prevenir e cuidar da ansiedade infantil

Um ambiente acolhedor, que prioriza o bem-estar infantil, tempo de telas controlado, contato com a natureza e o cuidado com a pressão e demandas direcionadas às crianças e aos adolescentes, são fatores de prevenção para a ansiedade infantil, assim como a promoção da autonomia, o exercício da tolerância à frustração e experimentação de vínculos fortes e saudáveis.

Do ponto de vista do tratamento: acompanhamento em terapia e com médicos especializados dão suporte para crianças que já estejam diagnosticadas- é preciso ficar atento aos sinais.

A ansiedade infantil é real e precisa ser olhada de perto, como o desafio que se apresenta na modernidade, mas pequenos hábitos, perdidos há tempos, como jogos colaborativos, trocas reais, em tempo real e brincadeiras ao ar livre podem ser caminhos para retornarmos à conexão tão necessária com nossas crianças.

Carolina Amiach

Orientadora Educacional – Escola PlayPen